quinta-feira, 9 de fevereiro de 2012

NYT: AVIÕES DOS EUA GERAM ULTRAJE NO IRAQUE, MAS FROTA CRESCE

VANT “Global Hawk”
Por Eric Schmitt e Michael S. Schmidt, no “The New York Times”

"NOSSO CÉU É NOSSO, NÃO É DOS EUA", diz um iraquiano

“Bagdá - Um mês depois de os últimos militares americanos terem deixado o Iraque, o Departamento de Estado está operando uma pequena frota de VANT (veículos aéreos não tripulados), ou aviões de vigilância. Alguns altos funcionários do Iraque dizem que os aviões não tripulados representam afronta à soberania iraquiana.

O programa foi descrito pela divisão de segurança diplomática do Departamento de Estado em termos gerais em um prospecto on-line de duas páginas para empresas que poderiam participar de licitações para administrar o programa. Ele pressagia possível ampliação das operações de VANT no braço diplomático do governo americano; até agora, eles foram usados principalmente pelo Pentágono e a CIA (Agência Central de Inteligência).

Empresas americanas dizem que foram informadas que o Departamento de Estado poderá utilizar aviões de vigilância não tripulados em um punhado de outros países "de alto risco", incluindo a Indonésia e o Paquistão, e no Afeganistão após a saída da maior parte das tropas americanas, nos próximos dois anos.

Os VANT representam o exemplo mais recente dos esforços do Departamento de Estado para assumir funções no Iraque que antes eram realizadas pelos militares. O Departamento de Estado começou a operar alguns VANT de modo experimental no Iraque no ano passado, intensificando o uso deles depois de os últimos soldados americanos terem deixado o país, em dezembro.

Um alto funcionário americano disse que estão em curso negociações para obter a autorização do Iraque para as operações atuais com os VANT. No entanto, Ali al-Mosawi, assessor de alto nível do primeiro-ministro, Nuri Kamal al Maliki; Falih al Favadh, assessor de segurança nacional do Iraque, e o ministro interino do Interior, Adnan al Asadi, falaram que não foram consultados pelos americanos. Asadi disse que se opôs ao programa dos VANT: "Nosso céu é nosso céu, não é o céu dos EUA".

O Pentágono e a CIA vêm intensificando o uso de VANT armados Predator e Reaper para lançar ataques contra militantes em lugares como o Paquistão, Iêmen e Somália. Mais recentemente, os Estados Unidos ampliaram suas bases de VANT na Etiópia e nas ilhas Seychelles.
 
VANT Predator 
VANT Reaper, derivado do Predator

Enquanto isso, os VANT do Departamento de Estado não carregam armas; sua finalidade é fornecer dados e imagens sobre perigos possíveis, como protestos públicos ou bloqueios de estradas, para uso por pessoal de segurança em terra, segundo autoridades americanas. São muito menores que os VANT armados, com envergaduras que podem ser de apenas 45 centímetros, contra 17 metros no caso dos aviões Predator.

O Departamento de Estado confirmou a existência do programa, descrevendo os aparelhos como veículos aéreos não tripulados. "É verdade que o Departamento tem um programa de VANT", disse o departamento em comunicado à imprensa. "Os VANT que estão sendo usados pelo Departamento de Estado não são armados nem podem ser armados."

Quando as forças americanas ainda estavam no Iraque, "blimps" (dirigíveis) brancos equipados com sensores sobrevoavam muitas cidades, garantindo aos americanos capacidades de vigilância para além das dos VANT armados e desarmados usados pelas forças armadas. Mas os dirigíveis aterrissaram no final do ano passado, quando os militares completaram sua retirada. Prevendo isso, o Departamento de Estado começou a desenvolver suas próprias operações com VANT.

Alguns especialistas independentes familiarizados com as operações dos VANT expressaram ceticismo quanto à capacidade do Departamento de Estado de administrar uma empreitada tão complicada e arriscada.

"O Departamento de Estado precisa entender que não é uma agência com experiência em conduzir operações de estilo militar", falou Peter W. Singer, autor de "Wired for War", um livro sobre robótica para fins militares.

Muitos iraquianos ainda nutrem ceticismo profundo em relação aos Estados Unidos. "Se eles têm medo que seus diplomatas sejam atacados no Iraque, então que os tirem do país", opinou o engenheiro Mohammed Ghaleb Nasser, 57, de Mossul, no norte do país.

Hisham Mohammed Salah, 37, proprietário de um internet-café em Mossul, não diferencia os aviões não tripulados de vigilância dos que disparam mísseis.

"De tempos em tempos, ouvimos falar que aviões não tripulados mataram metade de um povoado no Paquistão ou no Afeganistão, sob o pretexto de perseguir terroristas", disse Salah. "Nosso medo é que isso aconteça no Iraque, sob um pretexto diferente."

FONTE: escrito por Eric Schmitt e Michael S. Schmidt, no “The New York Times”. Transcrito na “Folha de São Paulo”

terça-feira, 7 de fevereiro de 2012

Concessão dos Aeroportos foi estratégia de redistribuição de renda

A concessão dos Aeroportos de Guarulhos, Brasília e Viracopos à inciativa privada desagrada a quem é contra as privatizações, por princípio.

E a princípio, o governo Dilma é contrário à privatizações. Então qual é a lógica dessas concessões?


Se olharmos bem a operação ao longo dos 20 a 30 anos, veremos que não há uma política pública de diminuição do Estado no setor aéreo, e sim um remanejamento de capital estatal de uma região para outra, a fim de promover o desenvolvimento regional.


O governo está arrecadando dinheiro em mercados ricos como São Paulo e Brasília, para investir em mercados menos desenvolvidos que precisam de aeroportos melhores, como nas regiões Norte, Nordeste, no Pantanal, em Foz do Iguaçu, etc. O resultado disso será melhor distribuição de renda, principalmente para a indústria do turismo.


A concessão rendeu R$ 24,5 bilhões pelo que já existe em São Paulo, Campinas e Brasília. Esse dinheiro é destinado ao Fundo Nacional de Aviação Civil (FNAC), que tem a finalidade de garantir verbas para outros aeroportos a serem reformados ou construídos sob direção ESTATAL, especialmente os regionais.

Portanto, o dinheiro do setor aéreo não está sendo "desestatizado", está sendo remanejado da região mais rica para as regiões mais pobres, corrigindo desequilíbrios regionais.
Outra fonte de receita destes aeroportos concedidos, também para reinvestir nos aeroportos estatais através deste Fundo:
- 10% do faturamento bruto anual de Guarulhos;
- 5% do faturamento bruto anual de Viracopos;
- 2% do faturamento bruto anual de Brasília.
Por fim, a Infraero continua dona da concessão de 49% destes três aeroportos e, portanto, continuará tendo metade dos lucros deles.
A ideia de conceder à iniciativa privada assusta, e protestos como os da CUT são justos, válidos e compreensíveis, pela má experiência das privatizações no passado, mas dessa vez nada tem a ver com o que foi feito na era tucana. Eis as diferenças:

- O governo concedeu por decisão estratégica própria, e não por imposição do FMI, nem por necessidade de pagar dívidas.
- Não há diminuição do estado no setor. O dinheiro será investido em outros aeroportos estatais.
- A concessão tem prazo: 20 anos para Guarulhos, 25 para Brasília, e 30 para Viracopos, podendo prorrogar apenas por 5 anos. Depois disso, os Aeroportos voltam às mãos Estado e, se lá o governo quiser deixar 100% nas mãos da Infraero ou fazer novo leilão, pode decidir o que for melhor.
- A Infraero não foi privatizada. Ela perdeu espaço nestes Aeroportos por uma mão, mas ganhará pela outra, nos Aeroportos estatais que receberão investimentos do FNAC.
- Se a Infraero não foi privatizada, não haverá demissões em massa de seus funcionários, como ocorria na privataria tucana. No máximo ocorrerá remanejamento, se houver excedente em algum dos aeroportos concedidos.
Se olharmos o todo, a operação foi engenhosa. Havia pouco interesse do capital privado em investir nas outras regiões, e havia muito interesse em investir em São Paulo e Brasília. O governo jogou com os investidores para fazer uma triangulação: captou dinheiro em São Paulo, que será investido no Nordeste, na Amazônia, no Pantanal, etc.
Detalhe: São Paulo e Brasília não terão nenhum prejuízo. Pelo contrário, as concessionárias estão obrigadas a investir R$ 16 bilhões nos 3 aeroportos ao longo dos anos, para ampliação e modernização.

Em tempo: o BNDES não está financiando o valor da concessão, como há gente mal informada dizendo por aí. O BNDES oferece empréstimo para obras de ampliação dos aeroportos, como sempre fez com outros empreendimentos industriais e de infra-estrutura.

A ciberguerra contra Cuba


Os governos incômodos do “Quarto Mundo”


Um processo de desenvolvimento tecnológico vertiginoso e cada vez mais global gerou uma revolução na tecnologia da informação, que transformou progressivamente o modo de pensar, produzir, consumir, fazer comércio, administrar e de relacionamento entre as pessoas. Ele estabeleceu como cultura o conceito de “realidade virtual”, ou seja, o real não se resume ao mundo físico como há 20 anos, mas em uma unidade entre o tangível e o virtual.

Segundo um artigo divulgado pela agência BBC Mundo, no último dia 25, a rede digital global avança como um voraz furacão e poucas vezes houve uma oportunidade para deter esse caminho e refletir sobre o seu crescimento. Onde antes reinavam as vendas de estéreo hoje imperam as de auriculares. Se entrássemos em uma máquina do tempo e viajássemos dez anos no passado, descobriríamos que, para tirar uma foto, escutar música ou filmar um vídeo, eram necessários três aparelhos diferentes. Mas agora essas atividades, e outras mais, se converteram para um único equipamento: um telefone inteligente.

Logicamente, um processo de evolução tecnológica como este é dominado por monopólios que respondem às minorias mais poderosas. Favorece o amplo acesso para determinados segmentos ou grupos sociais e gera uma assimetria em relação a outros grupos populacionais – carentes de importância para os interesses do capitalismo global – que os desconectam cada vez mais dos serviços que geram poder cultural e econômico. Esta massa de pessoas sem possibilidades reais de incidir de forma plena em um mundo profundamente interconectado, é chamada por alguns pesquisadores de “O Quarto Mundo”.

É nesse cenário internacional desigual que avança a sociedade cubana, que utiliza seu limitado acesso ao ciberespaço como ferramenta educativa ao serviço de seus cidadãos e para a difusão da verdade; ao mesmo tempo em que o maior império da história, mediante um bloqueio econômico e comercial, impede esta pequena ilha de obter os recursos necessários para estender os serviços na web a seu povo. Esse governo que nos ataca e seus aliados europeus geram campanhas midiáticas, em que divulgam falácias como o suposto temor do governo cubano em liberar o acesso pleno à internet e suas redes sociais, mas censura toda informação sobre a permanente agressão tecnológica que enfrenta nosso país.

Este cerco não tem precedentes na história desde a segunda metade do século passado, quando muitos dos avanços técnico-científicos se converteram em instrumentos indispensáveis para a cruzada contra o Socialismo, como parte da Guerra Fria.

A administração Obama aprovou milionários fundos dirigidos para fomentar esse “cibermercenarismo” na ilha; difamar sobre Cuba através das tecnologias de comunicação, assim como formar plataformas digitais desenhadas expressamente para evadir o controle do Estado cubano. O próprio jornal The New York Times publicou em junho de 2010 que a Casa Branca lidera um esforço global para criar uma “internet das sombras” e sistemas de telefonia móveis para “dissidentes” com o objetivo de “minar governos incômodos”. Esse plano inclui projetos secretos dirigidos a estabelecer redes independentes e garantir a vários usuários o acesso sem fio ao ciberespaço mediante plataformas portáteis (Wi-Fi), fáceis de transportar via fronteiras.

Nesta estratégia de ingerência, é considerado “legal” para o governo estadunidense fabricar “ciberdissidentes” ou mercenários virtuais orientados a difundir mensagens manipuladas ou incitar à desobediência civil em Cuba, empregando ferramentas como Twitter, Facebook, blogs e outros.  Ante esta hostilidade permanente, não se descarta que, em um futuro imediato, sejam incrementadas ações subversivas na ilha, com o emprego das tecnologias e, inclusive, gerar ações de ciberguerra, que inclui a intervenção direta do Exército em uma guerra, sob a anuência das leis, apelando ao uso das redes informáticas que controlam as infraestruturas críticas de qualquer país.

De fato, a Casa Branca recentemente deu ao Departamento de Defesa a missão para desenvolver operações ofensivas no ciberespaço caso os Estados Unidos se vejam “ameaçados” por seus “adversários”. Se estas ações não forem suficientes para causar dano, se prevê aplicar a opção de intervenção militar. Para a materialização dessa estratégia, Obama criou a infraestrutura de um cibercomando, e seu marco legal foi chamado de “estratégia internacional norte-americana para o ciberespaço”.

A ciberguerra é potencializada pelo imperialismo para subverter outras nações, convertendo a Internet em um campo de batalha, onde se empregam como armas as ferramentas virtuais, computadores e redes digitais. Nesse esquema, a estratégia subversiva não é uma opção secundária, mas a preparação de uma guerra armada frontal, que sempre começa com a fabricação dos pretextos para uma invasão.

Contra Cuba, ela se materializa através da propagação permanente na web de conteúdos contrarrevolucionários por mercenários na ilha ou indivíduos e organizações anticubanas radicadas dentro do próprio território estadunidense e em países aliados na Europa.

O financiamento para estas atividades provém de 20 milhões de dólares anuais que o Congresso dos Estados Unidos destina para a subversão contra o país caribenho, o qual se canaliza através da USAID, organização especializada em planos desestabilizadores contra Cuba. Segundo um artigo publicado no site “As Razões de Cuba”, esta entidade recebeu cerca de 150 milhões de dólares desde 1990 para destruir a Revolução, sem obter êxito algum.

Este desperdício de dinheiro dos contribuintes norte-americanos causou preocupação no senador John Kerry, que, em 2010, questionou a utilidade real destes fundos ante a inefetividade das ações subversivas planejadas contra a ilha há décadas.

Outra organização desta mesma confraria, que também se incorporou à estratégia subversiva contra Cuba empregando componentes tecnológicos como instrumento essencial, é o IRI (Instituto Republicano Internacional), nascido em 1983 ante o auspício do então presidente Ronald Reagan.

No ano passado, a televisão, a imprensa escrita e as rádio cubanas revelaram os planos destinados a entregar equipamentos do IRI dirigidos a entregar equipes de comunicação a pessoas na ilha e criar plataformas digitais “independentes”. Elas têm o objetivo de “romper” o suposto bloqueio informativo; incrementar o acesso e o fluxo de informação sobre “democracia, direitos humanos e a livre empresa” a partir e dentro de Cuba, através de acesso sem censura à internet; particularmente objetivam prover tecnologia de ponta capaz de evitar as “restrições do governo cubano”, ação muito parecida à tentativa de desestabilização interna ocorrido em nações da África do Norte e Oriente Médio ou na fórmula empregada com a Líbia.

Nos últimos anos, o IRI financiou contratos para a manutenção e apoio de projetos tecnológicos em Cuba de caráter de ingerência. Eles custeiam viagens, consultorias, hardwares e hospedagens de administradores de redes, serviço de telefonia móvel e o apoio à criação de páginas virtuais por blogueiros ao serviço de Washington.

Essa estratégia, cuja finalidade à primeira vista parece inofensiva, como tenta fazer parecer o governo estadunidense e seus mercenários, é um plano concebido para a subversão e a espionagem contra nosso país. Para sua concretização, enviam emissários que viajam por toda ilha, fazem contatos, treinam e abastecem os cibermercenários. São atos ilegais do governo dos Estados Unidos.

Mas se fosse Cuba quem tentasse atacar os EUA introduzindo ilegalmente tecnologia para criar redes de “dissidentes”, não há dúvidas que seu governo interpretaria isso como um ato de guerra e o cibercomando do Pentágono, junto com a IV Frota, atacariam imediatamente nossa ilha.

Nessas aventuras subversivas com emprego de tecnologias de ponta, o IRI é acompanhado por  outra ONG: a Fupad (Fundação Panamericana para o Desenvolvimento). Criada em 1962 por ordem da OEA e apoio da CIA, é uma das beneficiárias dos fundos da USAID para promover a desestabilização interna na ilha. 

Segundo o site Cuba Money Proyect, no ano de 2007, de um total de 13,3 milhões de dólares distribuídos pela USAID, foi assinado um contrato de 2,3 milhões para apoiar a contrarrevolução em nosso país; e, em 2009, de um orçamento de 15,620 milhões de dólares, a Fupad recebeu três milhões para prejudicar a maior de todas as Antilhas. Este financiamento garantia aos mercenários o fornecimento de blackberries, celulares de última geração, Bgan e outros dispositivos, que precisam ser ativados a partir de outros países a custos elevados.

Depois desta análise, é inegável que Cuba figura como um furo dentro do esquema de subversão, delito eletrônico e ciberguerra patrocinados pelos Estados Unidos. Em sua legítima defesa, nosso país deve continuar aumentando sua incorporação ao processo global de desenvolvimento da tecnologias de informação para proporcionar o avanço socioeconômico que desejamos, mas também para fortalecer o combate ideológico da internet e de suas redes sociais.

Para uma nação que, segundo a União Internacional de Telecomunicações, ocupa o quarto lugar no mundo no potencial de emprego das tecnologias de informação (em um ranking de 152 nações), é um verdadeiro feito empregar suas capacidades na defesa ante um inimigo que não descansará de nos agredir. E pela simples razão de termos escolhido um destino diferente para nosso povo. Como afirmou nosso Comandante-chefe em sua reflexão no último 24 de janeiro, perduramos como a “A fruta que nunca caiu” no seio do império.

Texto publicado originalmente em Cubadebate.

"O comunismo é a ideia da emancipação de toda humanidade"

O filósofo francês Alain Badiou é um homem que não teme riscos: nunca renunciou a defender um conceito que muitos acreditam ter sido queimado pela história: o comunismo. Em entrevista à Carta Maior, Badiou fala da “ideia comunista” ou da “hipótese comunista”. Segundo ele, tudo o que estava na ideia comunista, sua visão igualitária do ser humano e da sociedade, merece ser resgatado em um mundo onde tudo passou a ter um valor mercantil. Pensador crítico da modernidade, Badiou define o processo político atual como uma “guerra das democracias contra os pobres”.



Paris - Alain Badiou não tem fronteiras. Este filósofo original é o pensador francês mais conhecido fora de seu país e autor de uma obra extensa e sem concessões. Filosofia, matemática, política, literatura e até o amor circulam em seu catálogo de produções e reflexões. Sua obra, de caráter multidisciplinar, traz uma crítica férrea ao que Alain Badiou chama de “materialismo democrático”, ou seja, um sistema humano onde tudo tem um valor mercantil.

Este filósofo insubmisso é também um homem de riscos: nunca renunciou a defender um conceito que muitos acreditam ter sido queimado pela história: o comunismo. Em sua pena, Badiou fala mais da “ideia comunista” ou da “hipótese comunista” do que do sistema comunista em si. Segundo o filósofo francês, tudo o que estava na ideia comunista, sua visão igualitária do ser humano e da sociedade, merece ser resgatado.
Defensor incondicional de Marx e da ideia de uma internacionalização positiva da revolta, o horizonte de sua filosofia é polifônico: seus componente não são a exposição de um sistema fechado, mas sim um sistema metafísico exigente que inclui as teorias matemáticas modernas – Gödel – e quatro dimensões da existência: o amor, a arte, a política e a ciência. Pensador crítico da modernidade numérica, Badiou definiu os processos políticos atuais como uma “guerra das democracias contra os pobres”.

O filósofo francês é um teórico dos processos de ruptura e não um mero panfletário. Ele convoca com método a repensar o mundo, a redefinir o papel do Estado, traça os limites da “perfeição democrática”, reinterpreta a ideia de República, reatualiza as formas possíveis e não aceitas de oposição e coloca no centro da evolução social a relegitimação das lutas sociais.
Alain Badiou propõe um princípio de ação sem o qual, sugere, nenhuma vida tem sentido: a ideia. Sem ela toda existência é vazia. Com mais de 70 anos, Badiou introduziu em sua reflexão o tema do amor em um livro brilhante e comovedor, no qual o autor de “O ser e o acontecimento” define o amor como uma categoria da verdade e o sentimento amoroso como o pacto mais elevado que os indivíduos podem firmar para viver. Sua lucidez analítica o conduz inclusive a dizer que o amor, porque grátis e total, está ameaçado pelo mundo contemporâneo.

Revoluções árabes, movimento dos indignados, mobilização crescente dos grupos que estão contra a globalização, a luta ou a oposição contra as modalidades do sistema atual se multiplicaram e sofisticaram. Analisando o que ocorreu, o que você diria hoje a todos esses rebeldes do mundo para que sua ação conduza a uma autêntica construção?

Eu diria a eles que, para mim, mais importante que a consigna da anti-globalização, a qual parece sugerir que, por meio de várias medidas, pode-se re-humanizar a situação, incluindo a re-humanização do capitalismo, é a globalização da vontade popular. Globalização quer dizer vigor internacional. Mas essa globalização internacional necessita de uma ideia positiva para uni-la e não só a ideia crítica ou a combinação de desacordos e protestos. Trata-se de um ponto muito importante. Passar da revolta à ideia é passar da negação á afirmação. Somente no plano afirmativo poderemos nos unir de forma duradoura.

Um dos princípios de sua filosofia consiste em dizer que uma vida que não está regida pelo signo da ideia não é uma vida verdadeira. Agora, como defender hoje essa ideia sob a ameaça do hiper-consumo, das falsidades e injustiças da democracia parlamentar e em um mundo onde nossa relação com o outro passa pela relação com o objeto e não com as ideias ou com os indivíduos? No mundo contemporâneo, a ideia é o produto e não a relação humana.

A verdadeira vida é uma vida que aceita estar sob o signo da ideia. Dito de outro modo, uma vida que aceita ser outra coisa do que uma vida animal. Alguns dirão que há valores transcendentes, religiosos, e que é preciso submeter o animal; outros dirão, ao contrário, que devemos nos libertar desses valores transcendentes, que Deus está morto, que viva os apetites selvagens. Mas, entre ambas, há uma solução intermediária, dialética, que consiste em dizer que, na vida, através de encontros e metamorfoses, pode haver um trajeto que nos liga à universalidade. Isso é o que eu chamo “uma vida verdadeira”, ou seja, uma vida que encontrou ao menos algumas verdades.

Chamo "ideia" esse intermediário entre as verdades universais, digamos eternas para provocar um pouco os contemporâneos, e o indivíduo. Que é então uma vida sob o signo da ideia em um mundo como este? Faz falta uma distância com a circulação geral. Mas essa distância não pode ser criada só com a vontade, faz falta algo que nos ocorra, um acontecimento que nos leve a tomar posição frente ao que se passou. Pode ser um amor, um levante político, uma decepção, enfim, muitas coisas. Aí se põe em jogo a vontade para criar um mundo novo que não estará baseado na ordem do mundo tal como é, com sua lei de circulação mercantil, mas sim em um elemento novo de minha experiência.

O mundo moderno se caracteriza pela soberania das opiniões. E a opinião é algo contrário à ideia. A opinião não pretende ser universal, é minha opinião e vale tanto quanto a opinião de qualquer outra pessoa. A opinião se relaciona com a distribuição de objetos e a satisfação pessoal. Há um mercado das opiniões assim como há um mercado das ações financeiras. Há momentos em que uma opinião vale mais do que outra; mais tarde essa opinião quebra como um país. Estamos no regime geral do comércio da comunicação no qual a ideia não existe. Inclusive se suspeita da ideia e se dirá que ela é opressiva, totalitária, que se trata de uma alienação. E por que isso ocorre?

Simplesmente porque a ideia é grátis. Ao contrário da opinião, a ideia não entra em nenhum mercado. Se defendemos nossa convicção, o fazemos com a ideia de que é universal. Essa ideia é, então, uma proposta compartilhada, não se pode colocá-la à venda no mercado. Mas como tudo o que é grátis, a ideia está sob suspeita.

Pergunta-se: qual é o valor do que é grátis? Justamente, o valor do grátis é que não tem valor no sentido das trocas. Seu valor é intrínseco. E como não se pode distinguir a ideia do preço do objeto a única existência da ideia está em um tipo de fidelidade existencial e vital para a ideia. A melhor metáfora para isso é encontrada no amor. Se queremos profundamente a alguém, esse amor não tem preço. É preciso aceitar os sofrimentos, as dificuldades, o fato de que sempre há uma tensão entre o que desejamos imediatamente e a resposta do outro. É preciso atravessar tudo isso.
Quando estamos enamorados, trata-se de uma ideia e isso é o que garante a continuidade desse amor. Para se opor ao mundo contemporâneo pode-se atuar na política, mas estar cativado completamente por uma obra de arte ou estar profundamente enamorado é como uma rebelião secreta e pessoal contra o mundo contemporâneo. Esse é o principal problema da vida contemporânea. Estabeleceu-se um regime de existência no qual tudo deve ser transformado em produto, em mercadoria, inclusive os textos, as ideias, os pensamentos. Marx havia antecipado isso muito bem: tudo pode ser medido segundo seu valor monetário.

Você é um dos poucos filósofos que defende o que você mesmo chama “a ideia comunista”. Como é possível defender a ideia comunista quando seu conteúdo histórico foi desastroso.

Penso que o conteúdo histórico das ideias sempre pode ser declarado desastroso. Os democratas nos falam da democracia, mas se olhamos de perto a história das democracias, ela está cheia de desastres. Para tomar o exemplo mais elementar, se tomamos a Primeira Guerra Mundial, ela foi lançada por democratas, democratas alemães, ingleses e franceses. Foi um massacre inimaginável, o qual já se demonstrou esteve ligado a apetites financeiros nas colônias africanas, apetites que não diziam respeito aqueles que seriam massacrados mais tarde. Houve milhões de mortos e de sacrificados em condições espantosas e, aceite-se ou não, isso é parte da história das democracias. Se interrogamos o conjunto das experiências históricas veremos que todo o mundo tem sangue até as orelhas.

No que se refere à palavra “comunista” em si, da mesma maneira que ocorre com a palavra “democracia”, sempre se pode argumentar que ambas tem sangue até as orelhas. Mas, por acaso, é preciso sempre inventar outra palavra? Tomemos, por exemplo, o cristianismo. O cristianismo é São Francisco de Assis, a santidade verdadeira, o advento da ideia de uma verdadeira generosidade para com os pobres, a caridade, etc.,etc. Mas, do outro lado, também é a inquisição, o terror, a tortura e o suplício. Por acaso vamos dizer que é um crime alguém se chamar de cristão? Ninguém diz isso. Eu defendo uma espécie de absolvição dos vocábulos. Eles têm o sentido dado pela sequência histórica da qual falamos.

De fato, o comunismo conheceu duas sequências histórias. A sequência histórica do século XIX, quando a palavra foi inventada e propagada para designar uma esperança histórica humana fundamental, a esperança da igualdade, da emancipação das classes oprimidas, de uma organização social igualitária e coletiva. Depois há outra sequência muito diferente onde se experimentou o comunismo, ou seja, se construiu uma forma de poder particular que buscou coletivizar a indústria e essas coisas, mas que, no final, se tornou uma forma de Estado despótico.

Eu proponho que não se sacrifique a palavra “comunismo” por causa desta segunda sequência, mas sim que ela seja resgatada com base na primeira sequência, possibilitando assim a abertura de uma terceira sequência.

Nesta terceira sequência, a palavra “comunismo” significaria o que sempre significou: a ideia de uma organização social totalmente distinta da que conhecemos e que já sabemos que está dominada por uma oligarquia financeira e econômica absolutamente feroz e indiferente aos interesses gerais da humanidade. Eu proponho então voltar ao comunismo sob a forma da ideia comunista: a ideia comunista é a ideia da emancipação de toda a humanidade, é a ideia do internacionalismo, de uma organização econômica mobilizando diretamente os produtores e não as potências exteriores; é a ideia da igualdade entre os distintos componentes da humanidade, do fim do racismo e da segregação e também é a ideia do fim das fronteiras.

Não esqueçamos que as fronteiras são uma grande característica do mundo contemporâneo. O comunismo é tudo isso. Se alguém inventar uma palavra formidável para designar tudo isso, que não seja a palavra comunismo, eu aceito. Mas a história da política não é a história das palavras, mas sim a história dos novos significados que podem ter as palavras. Em geral se opõe a palavra “democracia” à palavra “comunismo”. Eu digo que uma palavra não é mais inocente do que a outra. Não lutemos pela inocência das palavras. Discutamos sobre o que significam e o que significa aquilo que eu digo.

segunda-feira, 6 de fevereiro de 2012

Neoconquistadores

Instalados no coração da vida social, os bancos estiveram por muito tempo ligados a um território, em cuja organização interferiam. Criado na Cantábria, no século XIX, o espanhol Santader lançou-se, na década de 1990, à conquista da América Latina, trocando os mosquetes pelas taxas de juros
Quando o semanário do jornal El País traçou “O retrato do poder” na Espanha, em 31 de outubro de 2010, foi seu rosto que apareceu na capa da revista. De quem? Emilio Botín – sobrenome que, na língua de Cervantes, significa “butim”. Décima fortuna espanhola, com um patrimônio de US$ 1,5 bilhão, Botín seria, de acordo com o jornal Le Monde, “o financista mais poderoso da Europa”.1 Filho e neto de banqueiro, ele está à frente de um mastodonte: o banco Santander.
Primeiro grupo espanhol, principal empresa financeira da América Latina, 37ª transnacional do planeta,2 o Santander é um dos três maiores bancos do mundo em termos de faturamento. Em 2010, empregava mais de 178 mil pessoas (54 mil na Europa ocidental e cerca de 90 mil na América Latina), gerou 1,2 trilhão de euros em ativos e obteve um rendimento bruto de 42 bilhões de euros. Enquanto a crise financeira ameaçava a maioria das instituições financeiras ibéricas, os lucros do Santander ultrapassavam os 8 bilhões de euros, pelo quarto ano consecutivo. “Crise? Que crise?”, perguntou o presidente Botín ao anunciar a aquisição do banco britânico Alliance & Leicester, em 2008.3
Em 1986, Emilio Botín substituiu o pai na presidência do grupo Santander. Nascido há 150 anos, o grupo estava em seu esplendor. Até ali, o setor bancário espanhol parecia uma fortaleza: protegidas do mundo exterior, sete entidades dividiam o mercado.4 Tão próximo do chefe de governo socialista Felipe Gonzalez – então no poder – quanto viria a ser de seu sucessor liberal José María Aznar, o presidente do banco reconheceu o presente que era a desregulamentação financeira. Ao sul dos Pirineus, dois glutões bancários logo devoraram tudo à sua volta: o BBVA, oriundo da fusão entre o Banco de Bilbao, o Banco de Vizcaya e as caixas de poupança Argentaria; e o Banco Santander Central Hispano (BSCH), que surgiu da aproximação entre o Banco Central, o Banco Hispano-Americano e o Banco Santander, seguida da aquisição do Banco Español de Crédito (Banesto). Em 2007, o grupo retomou o nome da comuna da Cantábria onde havia sido fundado: Santander.
Nova reconquista
No fim dos anos 1990, os dois grandes bancos espanhóis aproveitaram o processo de “abertura” e privatização das economias latino-americanas: entre 1997 e 2002, o BBVA investiu US$ 7,8 bilhões na aquisição de 34 bancos da região; no mesmo período, o Santander gastou US$ 12,3 bilhões para comprar 27. A exemplo de outras grandes empresas espanholas, como a Repsol (petróleo), a Telefónica (telecomunicações) ou a Endesa (energia elétrica), esses bancos alçaram-se à categoria de corporações transnacionais em processo de reconquista da América Latina pelo capital espanhol. Mas as compras do Santander não se limitam a essa parte do globo. Em 2004, ele pôs a mão no britânico Abbey, por 13,4 bilhões de euros; em 2007, retomou as atividades do holandês ABN Amro no Brasil e na Itália, por 19,9 bilhões de euros; em 2009, entrou no mercado norte-americano com a aquisição, por US$ 1,6 bilhão, do Sovereign.
Essa estratégia de expansão pretende ser ao mesmo tempo ofensiva (ganhar cotas de mercado) e defensiva (proteger-se contra potenciais aquisições hostis dos concorrentes). Para Botín, é o bê-á-bá dos negócios: “Não basta garantir um crescimento significativo mensal para defender os acionistas”, explicava em 2006. “Se um banco se contentar com esse objetivo, acabará ficando sem combustível.”5 Não é o caso do Santander: de 2004 a 2007, os lucros triplicaram. Entre 2003 e 2006, o volume de negócios da divisão latino-americana saltou de US$ 85 bilhões para 174 bilhões. Em 2010, enquanto a Espanha apenas começava a sair da recessão, a região representava 43% do rendimento do banco: “Faz vinte anos que estamos presentes na América Latina”, resumiu o diretor do banco para a região, em 2010. “É chegada a hora de colher os frutos desse trabalho.”6
Para as populações latino-americanas, a colheita se revela mais decepcionante. A chegada do Santander à região teve como saldo principal a perda de empregos nas instituições anteriormente detidas pelo Estado. Enquanto em 1997 o Santander Colômbia empregava 4.400 pessoas, em 2004 elas não passavam de 950, sem que tenha havido grandes alterações de seu âmbito de atividade. Presente no capital de 33 empresas sediadas em paraísos fiscais, o banco é acionista ou financiador de diversas empresas de armamentos. Ele também concede crédito (direta ou indiretamente) a projetos de alto impacto socioambiental, numa região onde a mineração é feita, na maioria das vezes, sem a menor consideração pela população local.7
Responsabilidade social corporativa
Diante das críticas, o banco Santander desenvolve o discurso da “responsabilidade social corporativa”. Essa “ética empresarial” deu corpo a novos “serviços inclusivos”, destinados às pessoas “desfavorecidas”. Objetivo: contribuir para a emergência de uma “cidadania corporativa”.8 Afinal, “uma América Latina onde mais cidadãos possam gozar do direito de abrir uma conta corrente, obter fundos ou pedir uma hipoteca será uma América Latina mais justa que aquela que conhecemos, em que os direitos financeiros [sic] são privilégio de uma minoria”, analisava um alto dirigente do banco em 2010.9 O Santander lançou então programas de microcrédito no Brasil, Chile, Argentina e El Salvador, distribuindo cartões de crédito e desenvolvendo as possibilidades de empréstimo, na perspectiva daquele que trabalha para o desenvolvimento da região. Mas trata-se também de “não depender exclusivamente das classes superiores”, pois “interessar-se pelas classes médias atuais e futuras” constitui, segundo o banco, “uma opção segura e rentável”.10
Na carta aos administradores que abre o relatório anual de 2010, Botín comemora os sucessos “que permitiram distribuir 19 bilhões de euros a nossos acionistas ao longo dos últimos quatro anos” –mais que todo o programa de austeridade espanhol para 2010-2011. Um programa considerado muito tímido: em março de 2011, Botín cercou-se de quarenta grandes empresários para convidar o primeiro-ministro José Luis Zapatero a “ficar firme”.11 E saiu do encontro mais tranquilo: 2011 “será um ano excelente”, declarou.
Dois meses depois, manifestantes ocuparam importantes pontos da Espanha para denunciar uma crise gerada, em grande parte, pela exuberância de um setor imobiliário galvanizado pela generosidade dos empréstimos concedidos pelos bancos espanhóis: “Não somos mercadorias nas mãos de políticos e banqueiros”,12proclamaram. Análise que alguns assim resumiram: “Seu butim, minha crise”.
 
Fonte: http://contextolivre.blogspot.com/

Quem são e por que lutam os “dissidentes” cubanos!

A foto ao lado correu o mundo pela mídia para ilustrar a “repressão” às “Damas de Blanco” em Cuba. A manipulação é flagrante. Observe que as pessoas que não estão de branco não são mostradas. As legendas e as matérias dizem apenas que são políciais, agredindo manifestantes pacíficos. Podem até ser policiais — vamos admtir essa hipótese para não sermos tão rigorosos com os manipuladores. Mas a mensagem ignora que uma multidão de cubanos — cerca de 400 “partidários do regime”, segundo a mídia torpe — enfrentou as manifestantes. De onde surgiram essas “Damas”? Vejamos.
Em meados de 2002, um sujeito astuto desembarcou em Havana, vindo dos Estados Unidos, pisando macio como se estivesse de sandálias de veludo. Atendia pelo nome de James Cason e em setembro daquele mesmo ano seria anunciado como o novo chefe do Escritório de Interesses dos Estados Unidos em Cuba. Era amigo de longa data de Otto Reich, o comandante das operações da “guerra suja” travada contra a Revolução Sandinista na Nicarágua. Ali, os dois atuaram juntos. Reich era o responsável por redigir proclamações e manifestos em nome dos grupos organizados por eles e que empreendiam a “guerra suja”. Cason atuava como recrutador de mercenários.
Com o caso “Irã-Contras”, um escândalo de corrupção e tráfico de armas para financiar os “contras” nicaragüenses, ambos foram afastados das operações por decisão do Senado dos Estados Unidos. Reich ficou atuando nas sombras até que em um momento de recesso do Congresso, já no governo do ex-presidente George W. Bush, foi nomeado subsecretário de Estado para Assuntos da América Latina. E uma de suas primeiras providências foi a de enviar Cason a Cuba para “sondar o terreno”.
Viagens de exploração
O momento era delicado para a ilha socialista. O governo dos Estados Unidos trabalhava febrilmente para convencer o mundo que um “eixo do mal” preparava ações para atacar o império. E, para se defender, a melhor defesa seria o ataque. O Iraque foi o primeiro país a entrar na alça de mira de Bush — a invasão do país começou no dia 19 de março de 2003. Cuba poderia ser a próxima vítima a qualquer momento.
Em setembro de 2002, antes de assumir oficialmente a chefia do Escritório de Interesses dos Estados Unidos em Cuba, Cason fez algumas viagens de exploração pelo país. Fez contatos, propostas e muitas reuniões. Com as informações levantadas, montou um plano de ação. A primeira atividade foi a convocação de uma manifestação para o dia 24 de fevereiro de 2003, quando se comemora na ilha o início da última guerra de independência contra a Espanha, em 1895. O ato ocorreu no apartamento de Martha Beatriz Roque — organizadora do grupo “Damas de Blanco” e conhecida mercenária cubana —, em Havana, com a presença de cerca de 30 pessoas. Tudo feito às claras, com declarações públicas.
Liberdade e justiça
Em uma entrevista coletiva, Cason anunciou o plano de intensificar os esforços pela “transição democrática” em Cuba e pronunciou verdadeiros impropérios contra o líder revolucionário e então presidente cubano, Fidel Castro. Quando um jornalista lhe perguntou se a sua presença no ato não confirmava a denúncia do governo cubano de ingerência em assuntos internos, Cason disse: “Não, porque acredito que aqui convidaram todo o corpo diplomático e, como convidado, não tenho medo.”
Em seguida ele revelou a verdadeira intenção da reunião. “Infelizmente, o governo cubano, esse sim, tem medo. Medo da liberdade de consciência, da liberdade de expressão, medo dos direitos humanos. Os grupos (de “dissidentes” organizados por ele) estão demonstrando que há cubanos que não têm medo”, disse. E finalizou a declaração: “Estou aqui como convidado e vou percorrer todo o país, visitando todas as pessoas, que, sim, querem liberdade e justiça.”
Invasão do país
Os cubanos presentes eram pessoas que os norte-americanos capturavam no mar e mandavam de volta à ilha — geralmente com antecedentes criminais ou com problemas legais que as impedem de serem enquadradas nas regras para um visto de saída conforme o acordo migratório entre Cuba e Estados Unidos. Cason agrupou essas pessoas em uma “organização de ex-balseiros” e deu-lhes a denominação de “dissidentes”. Outro grupo foi organizado como “jornalistas independentes”.
Logo depois da reunião, Cason viajou para Miami — onde intensificou os ataques a Cuba e a Fidel Castro. Nos dias seguintes, ele fez um intenso vai-e-vem entre Havana e Miami. E sempre concedia entrevista coletiva, matéria-prima que alimentou uma onda anticubana ignominiosa pela mídia. O objetivo era provocar a sua expulsão ou algum outro tipo de atrito para criar um fato que justificaria a invasão do país. O assunto foi debatido pela Assembléia Nacional cubana, que chegou à conclusão de que o país estava diante de uma armadilha.
Celas solitárias
Outra medida que complementaria o plano Reich-Cason foi a transferência dos “Cinco Heróis da República” cubanos, presos nos Estados Unidos quando estavam em missão para combater o terrorismo contra a ilha, para unidades especiais, no dia 6 de março de 2003. Foram tomadas medidas rigorosas contra eles, como o confinamento em celas solitárias. No dia 10 de março, o Ministério das Relações Exteriores de Cuba entregou uma nota diplomática de protestos a Cason.
A situação já havia chegado a um ponto crítico. No dia 12 de março de 2003, foi realizada, na residência de Cason em Havana, uma atividade com 18 “dissidentes”. No dia 14, o grupo votou a se reunir. E, desde então, passaram a se encontrar regularmente. A invasão do Iraque estava próxima. E uma atmosfera de guerra tomou conta do país.
Tensa negociação
Duas horas antes de começar a invasão do Iraque, no dia 19 de março de 2003, um avião da ilha da Juventude, fazendo a última viagem do dia, foi seqüestrado por seis pessoas e desviado para os Estados Unidos com mais um grupo de “dissidentes” a bordo, onde receberam permissão para ficar em virtude da imoral Lei de Ajuste Cubano. Os demais passageiros foram incitados e ficar e, diante da recusa, foram hostilizados e devolvidos a Cuba.
No dia 31 de março de 2003, outro avião foi seqüestrado, com 45 passageiros a bordo. O líder dos seqüestradores anunciou que desviaria o vôo para Miami, mas o combustível não dava. O avião pousou na ilha da Juventude e iniciou-se uma tensa negociação, comandada pessoalmente por Fidel Castro. O próprio piloto se recusava a voar, indignado com a ousadia dos “dissidentes”. Foi preciso uma longa conversa de Fidel Castro para convencê-lo a levar o avião para as Bahamas.
Pena capital
No dia seguinte, 1º de abril, na baía de Havana, houve o seqüestro de uma embarcação cheia de passageiros — alguns, turistas — por um grupo de onze ou doze “dissidentes”. De novo, Fidel Castro comandou pessoalmente as negociações, que resultaram na prisão do chefe dos sequestradores e na liberação da embarcação. Duas turistas francesas se jogaram na água. Na distração do líder do bando, um membro do Ministério do Interior que estava a bordo se atracou com ele e o dominou.
Diante da situação, a Assembléia Nacional aprovou a aplicação de penas previstas na legislação do país, de acordo com decisões da Justiça. Três “dissidentes” receberam a pena capital. Outros tantos foram apenados de acordo com os mais rígidos preceitos do Estado de Direito e das regras judiciais internacionais. Logo em seguida, começou a campanha internacional da direita pela libertação dos “presos políticos”, que tem nas “Damas de Blanco” um de seus pontos de apoio.

A esquizofrenia do discurso anti-cubano

Luiz Manfredini *

 A viagem da presidente Dilma Roussef a Cuba, na semana passada, proporcionou ao discurso conservador – e à mídia que tão histrionicamente lhe presta serviços – mais uma das suas incursões recorrentes (e esquizofrênicas) em relação à vigência dos direitos humanos em Cuba.


Há, nesse discurso conservador, algumas vigas mestras que merecem registro. Trata-se de um discurso de propaganda (arma de combate político e ideológico, para usar a expressão feliz da presidente Dilma) e, como tal, faccioso, pois se sustenta naquilo que melhor lhe convém. Isto significa que ignora olimpicamente um campo fundamental dos direitos humanos, o dos direitos econômicos e sociais, a começar pelo mais elementar, pelo que é verdadeiramente essencial: o direito à vida. Evidentemente não teria como acusar Cuba nesse campo em que a Ilha é campeã indiscutível. Então volta as costas para essa face dos direitos humanos em Cuba.

Restam-lhe os direitos políticos. O pensamento conservador não consegue operar com outra noção política que não seja a da democracia liberal, meramente formal, restrita e epidérmica. Por isso é incapaz de perceber como a democracia socialista amplia substancialmente os direitos políticos da sociedade, enraizada que está em seus mais remotos rincões, fomentando consciência política e participação em massa e a todo instante. Ou pensam que aquelas gigantescas manifestações revolucionárias em Havana são realizadas sob a mira de fuzis? Ou pensam que democracia é o debate entre os ricaços que disputam a Presidência dos Estados Unidos, movidos a milhões de dólares, diante de um eleitorado cada vez mais apático e descrente?

Mas o discurso conservador, em função de sua natureza propagandística, em também precisa descontextualizar a questão dos direitos humanos em Cuba. Mais uma vez o seu viés esquizofrênico, ou seja, apartado da realidade, delirante e opaco, ignora que a pequena Ilha está em guerra desde que deixou de ser cassino e prostíbulo para os endinheirados norte-americanos. Guerra que envolve desde o bloqueio econômico capitaneado pelos Estados Unidos até as mais sutis (e mesmo escancaradas) manobras de cerco diplomático, administrativo, militar e cultural. Guerra que vai das aparentemente ingênuas panfletagens a partir de pequenos aviões que, partindo da Flórida, por vezes burlam as defesa aéreas cubanas, até os mais perversos atos de sabotagem e terrorismo, como a guerra bacteriológica para envenenar plantações. Incrível é a ação do Escritório de Interesses dos Estados Unidos em Havana, que apóia, inclusive com dinheiro e materiais, iniciativas que visam derrubar o governo constitucional. O próprio Fidel, tempos atrás, admitiu que as franquias democráticas em Cuba poderiam ser mais amplas, não fosse o clima de subversão da ordem patrocinado pelos Estados Unidos, obcecada em derrubar o que a revolução construiu.

A rigor, o grande crime contra os direitos humanos no território cubano está na base militar norte-americana de Guantânamo, onde 171 prisioneiros acusados de terrorismo são mantidos num limbo jurídico. Nenhuma palavra sobre isso da mídia que representa o pensamento conservador? Nenhuma. Compreende-se: a esquizofrenia anti-cubana só trata do que lhe convém. Para ela, qualquer batedor de carteira, quando preso, é promovido a “dissidente”. As Damas de Branco e aquela blogueira picareta são as queridinhas dessa mídia reacionária, tratadas como as lídimas representantes de uma sociedade oprimida pela revolução. Quanta desfaçatez! Elas falam pelos cotovelos, volta e meia organizam manifestações (com apoio popular praticamente zero) e ainda posam de vítimas. E a mídia repercute esse pensamento de facção, sendo hegemônico, acaba por moldar a opinião pública, incluindo aí, lamentavelmente, certos setores da própria esquerda.

A postura da presidente Dilma em Cuba foi digna e não caiu nas armadilhas do conservadorismo. Querem discutir direitos humanos? Mas o façamos de modo multilateral e comecemos questionando o bloqueio norte-americano e Cuba e a base militar de Guantânamo. Foi mais ou menos o que ela disse em Havana, criticando os que usam o tema como arma política e ideológica.
Ao fazê-lo, Dilma refez-se de certa vacilação em política externa que marcou o início do seu governo. Na época, ao criticar o Irã, ela própria ergueu a bandeira dos direitos humanos de modo algo unilateral, fazendo coro, mesmo que esse não fosse seu desejo, com a hipocrisia do governo norte-americano. Refez-se disso, e bem. Vamos em frente.

domingo, 5 de fevereiro de 2012

Aval para CNJ investigar juízes resulta de 'participação popular'

É a opinião da corregedora nacional de Justiça, Eliana Calmon, símbolo da luta por transparência no Judiciário, o mais fechado ao controle social. Para ela, Supremo Tribunal Federal teve atitude de 'vanguarda' ao ouvir sociedade. E decidiu a favor do Conselho Nacional de Justiça em resposta a um 'grande movimento de cidadania', colocando o país no 'rumo da democracia plena'.

Brasília – A decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) de liberar o órgão de controle externo da magistratura, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ), para investigar juízes é um exemplo de como o poder Judiciário, encarado como neutro e técnico, também é um órgão político e, como tal, influenciável pela opinião pública.

Essa é uma das conclusões de entrevista dada nesta sexta-feira (3) pela corregedora nacional de Justiça, Eliana Calmon, na qual a ministra, que se tornou um símbolo da luta por mais transparência no Judiciário, o mais fechado de todos os poderes, comentou a decisão tomada na véspera pelo STF.

Para Eliana, o julgamento foi resultado de um “grande movimento de cidadania” e de “participação popular” e coloca o Brasil “no caminho para uma democracia plena”.

“Nunca vi, com 32 anos de magistratura, uma discussão tão ampla e tão participativa, do ponto de vista de todos os segmentos da sociedade, sejam as pessoas mais simples do Brasil, até aqueles juristas mais renomados”, disse a ministra, mencionando cartas, emails, artigos e entrevistas como exemplos de manifestações.

Segundo ela, foi o próprio Supremo quem optou por ouvir a voz das ruas neste caso ao, “numa atitude de vanguarda e também de prudência”, adiar o julgamento treze vezes, “para que fosse possível à sociedade discutir, se assenhorar e amadurecer as ideias”. Um processo “histórico”, na avaliação da ministra.

A decisão do STF ainda não tem aplicação imediata sobre os 56 inquéritos que, de acordo com Eliana, estão parados na corregedoria desde o fim do ano passado, quando o ministro do STF Marco Aurélio Mello tinha dado liminar impedindo esse tipo de investigação.

Ainda é preciso que o Supremo conclua o julgamento da ação dentro da qual tinha sido contestado o direito de o CNJ apurar juízes por conta própria, independentemente do que fazem ou deixam de fazer as corregedorias dos tribunais. Só depois é que a sentença será publicada, o que não tem data para ocorrer, e o CNJ poderá tocar os 56 processos e instaurar novos.

Lupa no patrimônio
Para Eliana Calmon, o aval dado ao CNJ para investigar juízes deverá de influenciar um outro julgamento do STF que é essencial à eficácia do poder fiscalizatório da corregedoria nacional. A ministra é alvo de um mandado de segurança por ter começado a apurar a evolução patrimonial de juízes e funcionários de tribunais.

A mesma entidade corporativa que tentou proibir os inquéritos do CNJ, acionou o STF para proteger o patrimônio de investigações, a Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB). No último dia de trabalho do STF em 2011, o ministro Ricardo Lewandowski aceitou o mandado, concedeu liminar e bloqueou as apurações.

No julgamento desta quinta-feira (2) sobre os poderes investigatórios do CNJ, Lewandowski, que comanda o Tribunal Superior Eleitoral (TSE), votou contra o Conselho.

Para Eliana Calmon, se o CNJ pode investigar, é “natural” que também possa analisar o patrimônio de juízes e de funcionários dos tribunais, ato de caráter apuratório. A ação da AMB blindou 216 mil pessoas deste olhar independente do CNJ.

Fonte: Carta Maior

DILMA, HAITI, CUBA E OS TELHADOS DE VIDRO

Dilma, na chegada no Haiti
Por Beto Almeida

“Inspirada, quem sabe, no sambista mineiro Ataulfo Alves, que, por sua vez, inspirou-se em Cristo, Dilma Roussef desafiou em Havana a quem teria moral de atirar a primeira pedra no debate que, de modo distorcido, manipulado e enviesado se faz sobre direitos humanos para fazer pré-condenação a Cuba. Com estas declarações corajosas – propondo o debate a partir do centro de torturas que os EUA mantêm na Base de Guantánamo - a mandatária brasileira honrou o Brasil, o povo brasileiro, não eximindo nosso país de um auto-exame, ao lembrar que todos têm telhado de vidro, até nós.

Claro, sabemos que temos uma taxa elevadíssima de homicídios, de execuções por milícias e forças segurança, de cidadãos presos mesmo com penas já cumpridas, de torturas sistemáticas em dependências policiais, de violência no campo majoritariamente impune. Raras vezes na história tivemos posturas presidenciais com tamanha coragem e sinceridade. E com honesta dose de autocrítica. Sequer erradicamos o analfabetismo, ou o trabalho infantil, que, aliás, está crescendo lá nos EUA como provam a estatísticas.

Havana
 
Certamente, Cuba pode não ser o paraíso, mas das 200 milhões de crianças desnutridas hoje no mundo, a caminho da pena de morte da fome, nenhuma delas é cubana! E nenhuma criança cubana trabalha! As declarações da presidenta servem, sem dúvida, para colocar esse debate no patamar concreto e longe das manipulações interessadas que se fazem com o uso das esfarrapadas bandeiras dos direitos humanos acenadas exatamente pelos países que mais guerras produzem, mais invasões perpetram sobre povos mais débeis, mais ditaduras constroem, mais rapinas exercitam sobre os países pobres. Na liderança, obviamente, os EUA.

CUITO CUANAVALE E OS DIREITOS HUMANOS.

Um vergonhoso manto de silêncio e de sonegação informativa foi levantado em torno de Cuba para que o mundo não conheça suas conquistas sociais, sua resistência às agressões sofridas por mais de meio século de Revolução, incluindo-se atentados terroristas, guerras bacteriológicas comprovadas. A visita de Dilma também joga luz sobre a existência de bloqueio midiático contra Cuba. Por exemplo: nunca se informou com a devida honestidade e relevância, a epopéia da contribuição de Cuba, na década de 70, que enviou 400 mil homens e mulheres a Angola - inclusive a filha do Che - para defender a independência do povo angolano cujo território foi ocupado por tropas da racista África do Sul de então. Como afirma Nelson Mandela, a humanidade deve a Cuba a derrota do cruel regime do apartheid, derrotado por tropas cubanas-angolas-namibianas na Batalha de Cuitocuanavale. Com o nascimento de Telesur, já se informa corretamente sobre essa contribuição de Cuba para libertar a África do apartheid. Talvez, um acordo da TV Brasil com a TV Cubana permitisse desfazer centenas de desinformações, mitos e distorções construídos contra a ilha caribenha. E colocar dose de realismo e objetividade no debate sobre direitos humanos, como sugere Dilma.

A política externa brasileira, afirmada e expandida a partir de Lula, agora continuada por Dilma, é forma prática e concreta de furar aquele bloqueio. A presença do estado brasileiro, com o BNDES, com a Embrapa, a Petrobrás, empresas privadas, movimentos sociais, os acordos na área de saúde e de desenvolvimento agrário, é mais que um enfrentamento efetivo ao bloqueio dos EUA sobre a Ilha. É, também, passo decisivo na linha de integração latino-americana e caribenha que inclui expansão produtiva, de infraestrutura, comercial, científica, cultural, dentro da visão geoestratégica já consignada na criação da CELAC (Comunidade de Estados da Latino América e Caribe) . O que revela consciência diante da necessidade de pensar novo modelo de desenvolvimento, cooperativo, solidário, federativo, e ,também, diante da necessária prevenção face aos efeitos que a crise do capitalismo pode descarregar sobre nossa região, uma alternativa de longo prazo. Não há perspectiva para nenhum país isoladamente, sugerem esses acordos.

A LOCOMOTIVA DO CARIBE
Porto de Mariel-Cuba
 
Apesar de enfurecida e desconcertada pelo comportamento independente e altivo de Dilma Roussef, a imprensa brasileira teve que reconhecer, por debaixo do dilúvio de preconceitos que espargiu em sua cobertura sobre a visita presidencial a Havana, que, na prática, o Porto de Mariel, construído com participação brasileira, é nova locomotiva para o Caribe. Não apenas será o maior porto da região, dinamizando o comércio de toda a região, como será, também, pólo industrial, estando prevista a instalação de indústria de vidros - carência crônica da região - e até mesmo a produção de açúcar e de energia da biomassa da cana. Incide, também, na expansão dos forças produtivas. Nesse particular, vela lembrar que há em Cuba importantes desenvolvimentos tecnológicos alcançados pelo “Instituto Cubano de Investigaciones de Derivados de La Caña”, criados por Che Guevara, quando Ministro da Indústria, que certamente receberão agora significativos impulsos, tendo em vista que a Odebrecht, empresa brasileira ali instalada, também atua com desenvoltura nessa área da aplicação da alcoolquímica, inclusive com metas de grande porte na produção de embalagens biodegradáveis.

Mas, o editorialismo preconceituoso predominante na mídia contra Cuba dificulta que o povo brasileiro possa ser informado adequadamente sobre o alcance dos acordos firmados entre Brasil e Cuba. Além dos já citados, os acordos na área de saúde incluem cooperação em pesquisa, produção de medicamentos (a Fundação Oswaldo Cruzparticipa da empreitada), na formação de médicos e agentes de saúde, com a relevante contribuição da “Escola Latina-Americana de Medicina”, onde estudam centenas de brasileiros de família humildes, muitos deles do MST. Os jovens do MST, que estudam ao lado de jovens negros e pobres do Harlem, dos EUA, dificilmente teriam outra oportunidade para formarem-se como médicos, gratuitamente, como em Cuba. Bom tema para incluir no debate concreto sobre direitos humanos, não?

HAITI
 
Pela pedagogia dos gestos e atitudes, Dilma Roussef revelou pontaria política de alcance internacional ao dar uma banana ao “Fórum de Davos” e preferir o “Fórum de Porto Alegre”, onde afirmou que as fórmulas européias para crise são fracassadas. Além disso, em seu discurso aos movimentos sociais, citou a “Revolução dos Cravos” e a canção “Grandola, Vila Morena”, “O povo é que mais ordena”, ressaltando que, enquanto na Europa se destroem salários, direitos sociais e práticas democráticas pela tirania dos banqueiros, na América Latina está sendo construído outro mundo possível, seja pela expansão dos direitos sociais, pelo crescimento econômico, pela distribuição de renda e pela integração regional com o fortalecimento do MERCOSUL, da UNASUL, e, agora, da CELAC. A Europa, tida como avançada, retrocede e se rebaixa ao capital especulativo, à imposição dos países mais fortes sobre os mais fracos, à ditadura financeira, com retrocesso sócio-econômico e agressão militarista contra a Palestina, a Líbia, a Síria, o Irã. Sem esquecer as novas ameaças da militarista Inglaterra contra a Argentina, que recebe, por sua vez, a solidariedade brasileira na defesa da soberania platense sobre as Malvinas.

DIREITOS HUMANOS, UMA DIMENSÃO CONCRETA

Seguindo a lógica sempre destacada por Lula - a integração pressupõem o crescimento de todos os países juntos – Dilma, de Cuba para o Haiti, para firmar novos acordos de cooperação, em parceria com Cuba, que alcançam a doação de ambulâncias, medicamentos, construção de unidades de saúde, hospitais, laboratórios, dando dimensão concreta e clara do que significa contribuir para a valorização dos direitos humanos em escala internacional. Além disso, o Batalhão de Engenharia do Exército, que já realizou diversas obras de infraestrutura no Haiti (pontes, cisternas, estradas) , antes e depois do trágico terremoto, está a construir a única usina hidrelétrica daquele país, que tem merecido, uma vez mais, o mais completo desprezo por parte de países como EUA e França, que se negam, até hoje, a realizar o depósito dos recursos em favor do povo haitiano, descumprindo compromisso com a ONU. E são os que mais acenam a bandeira esfarrapada dos direitos humanos para justificar guerras e matanças, como na Líbia e na Síria agora.

JORNALISMO DE INTEGRAÇÃO

Por fim, vale questionar o enfoque da mídia brasileira na cobertura sobre a viagem de Dilma a Cuba e Haiti, pontuado pela desqualificação dos países visitados como se fosse viagem inútil e perdida. Perdida talvez tivesse sido a viagem de Dilma a Davos. Será que, numa eventual viagem da presidenta aos EUA, por exemplo, esse jornalismo de desintegração, de separação dos povos, de hostilidade à cooperação, daria o mesmo espaço à cobertura com entrevistas aos sem-tetos norte-americanos, aos ocupantes de Wall-Street, às estatísticas das violações de direitos humanos ali, à indagação sobre os presos e desaparecidos em razão da Lei Patriótica após o 11 de setembro, aos prisioneiros sequestrados ilegalmente em qualquer parte do mundo e transladados para a câmara de tortura de Guantánamo? Será que essa mídia condenaria Dilma por, eventualmente, criticar ou não se somar ao belicismo do Prêmio Nobel da Paz, Barack Obomba?
Centro de Torturas de Suspeitos, em Guantánamo, na Ilha de Cuba

Sim, tem razão a presidenta quando afirma que todos possuem telhados de vidro. O que coloca nova ótica na discussão e reflexão sobre o tema dos direitos humanos. Particularmente aos que aqui, nas fileiras da esquerda, esgrimem a bandeira de direitos humanos contra Cuba, mas se calam contra a arbitrária prisão do jornalista negro Múmia Abu Jamal nos EUA, condenado por juiz racista à pena de morte, agora comutada para prisão perpétua. Ou que se calam diante dos assassinatos de cientistas iranianos, que se calam diante da matança de 200 mil líbios pela OTAN que tanto bradou hipocritamente a bandeira dos direitos humanos.

O jogo está sendo jogado e, nesse xadrez, Dilma entra não apenas com postura e declarações corajosas que ,aliás, marcam sua vida. Entra, também, com a expansão dos acordos de cooperação entre povos, com a solidariedade concreta, com investimentos, com mais protagonismo de estado, com ajuda técnica, financeira, alavancando uma nova América Latina e Caribe, no âmbito da CELAC. Contribui, com isso, para virar a página da herança colonialista dos “Cem Anos de Solidão” e abrir a nova era, ainda embrionária, dos “Cem Anos de Cooperação”. Para o que falta, urgentemente, jornalismo de integração.”

FONTE: escrito por Beto Almeida, jornalista, membro da Junta Diretiva da Telesur. Transcrito no site “Carta Maior”

Tempos Modernos: Trabalho e alienação na Revolução Industrial

Guerra dos EUA e Israel contra o Irã começou

Fonte dessa imagem AQUI.

Especialistas militares avaliaram, nesta quinta-feira, que a guerra entre o Irã e os EUA já começou, a julgar pelo movimento de tropas na região e os últimos acontecimentos no cenário montado pelas nações ocidentais no Golfo Pérsico. Fontes ouvidas pela agência espanhola de notícias RicTV atestam que, agora, “é apenas uma questão de horas para o início do conflito armado”. A morte do cientista iraniano em um atentado foi, segundo analistas, um ponto decisivo para o agravamento do quadro de confronto entre as forças norte-americanas, israelenses e do Irã.

A morte de Mostafa Ahmadi Roshan, de 32 anos, engenheiro nuclear iraniano, em um atentado a bomba, nesta quarta-feira, provocou uma onda de revolta em Teerã contra Israel, o principal suspeito, e contra os Estados Unidos, que afirmaram não ter qualquer ligação com o atentado. A edição desta quinta-feira dos principais jornais iranianos pede represálias imediatas contra ambos os países.

“Sob a lei internacional é legal executar represálias com o assassinato do cientista nuclear”, afirma o jornal iraniano Keyhan, em um editorial. “A República Islâmica conquistou muita experiência em 32 anos. Portanto, é possível assassinar autoridades e militares israelenses”, completa o texto. O assassinato domina o noticiário naquele país e muitos criticaram o que chamaram de silêncio do Ocidente sobre as mortes. Os jornais mais radicais pedem, inclusive, uma ação secreta contra Israel.

Ainda prudente em seus pronunciamentos, o governo iraniano disfarça a irritação com o episódio mas garante que obteve provas de que “interesses estrangeiros” estavam por trás da morte do cientista Roshan, subdiretor da central de enriquecimento de urânio de Natanz. Ele morreu quando dois homens, em uma motocicleta, pararam ao lado do automóvel do cientista, retido em um engarrafamento em Teerã, e colocaram uma bomba magnética na porta, após o que se ouviu uma forte explosão.

A bomba também matou o motorista e o segurança de Ahmadi Roshan, enquanto um terceiro ocupante do carro, um modelo Peugeot 405, ficou ferido. O ataque foi similar a outros quatro que aconteceram em Teerã nos últimos dois anos. Três cientistas, incluindo dois que também trabalhavam no programa nuclear iraniano, morreram, enquanto outro – que agora dirige a Agência de Energia Atômica do Irã – escapou por pouco tempo de um atentado.

Capitalismo em declínio

Pomo da discórdia entre o Irã, Israel e os EUA, a energia nuclear foi o tema central dos pronunciamentos realizados em Havana, na noite passada, durante a recepção ao presidente iraniano Mahmoud Ahmadinejad promovida pelo presidente cubano, Raúl Castro. Ambos defenderam o direito de todos os países ao uso pacífico da energia nuclear, no clímax da escalada militar em curso na região do Golfo Pérsico.

Os dois governantes “ratificaram o compromisso dos dois países na defesa da paz, do direito internacional e dos princípios da Carta das Nações Unidas, assim como do direito de todos os Estados ao uso pacífico da energia nuclear”, afirma um comunicado oficial.

O apoio cubano ao programa nuclear iraniano foi anunciado na mesma semana em que os presidentes da Venezuela, Hugo Chávez, e da Nicarágua, Daniel Ortega, fizeram o mesmo. De acordo com a nota oficial, durante o encontro no Palácio da Revolução de Havana, Raúl Castro e Ahmadinejad conversaram sobre “o excelente estado das relações bilaterais e temas do âmbito internacional”.

– Estamos observando que o sistema capitalista está em decadência, em diferentes cenários, como em um beco sem saída, e é necessária uma nova ordem, uma nova visão, que respeite todos os seres humanos, um pensamento baseado na justiça. Quando já lhe falta lógica recorrem às armas para matar e destruir. Hoje em dia a única opção que restou ao sistema capitalista é matar – disse Ahmadinejad, em uma conferência na Universidade de Havana, onde recebeu o título Doutor Honoris Causa em Ciências Políticas.

Ahmadinejad reivindicou uma nova ordem mundial baseada na justiça e que respeite todos os seres humanos e encorajou Cuba e seus universitários a trabalharem ao lado de seu país para criá-la.

– Temos que estar alertas. Se nós não planejamos a nova ordem no mundo, serão os herdeiros dos donos de escravos e os capitalistas a controlar e impor o novo sistema – afirmou.

Questão de horas

Enquanto Ahmadinejad se movimenta pela América Latina, em busca de uma sólida aliança com países socialistas da região, o porta-aviões da classe Nimitz, modernizado e com armas mais letais se posiciona próximo ao Estreito de Ormuz. Nos últimos dias, os EUA trasladaram um grupo de militares especializados em desembarque e um batalhão inteiro de marines. A tropa segue embarcada nos navios anfíbios Makin Island, New Orleans e Pearl Harbor. Soma-se à força naval uma esquadrilha reforçada de helicópteros e um batalhão de retaguarda. As informações foram divulgadas, nesta manhã, pela RicTV.

A agência acrescenta que o serviço de comunicações da Armada norte-americana comunicou que a principal função do novo grupo de combate, encabeçado pelo super porta-aviões é apoiar o exército em suas operações no Afeganistão e participar de manobras internacionais na região. Especialistas ouvidos, no entanto, advertem que o aumento no número de embarcações dos EUA nas costas do Irã é um fator marcante para o aumento da tensão entre os dois países, com desfecho previsto em questão de horas. Fernando Bazán, um dos analistas internacionais, em entrevista aos jornalistas, aponta a escalada do poderio armamentista dos EUA no Mar Arábico.

– De um lado, Washington envia cada vez mais navios de guerra para a região por sua preocupação com o avanço da produção nuclear iraniana, ainda mais depois que Teerã confirmou a produção de urânio enriquecido a 20% em uma instalação subterrânea. De outra parte, o Irã é um dos países mais importantes na política regional e pode influir na maioria dos processos em curso no Oriente Médio, com apoio aos grupos xiitas – afirmou Bazán.

Além do USS Nimitz, o vespeiro em que se encontra o Estreito de Ormuz contará, nos próximos dias, com a presença de um grupo de combate da V Frota Marítima, encabeçado pelo porta-aviões Carl Vinson, com aeronaves a bordo. Estes equipamentos se somam a um outro grupo de navios de guerra estacionado na região desde dezembro último. Estas belonaves já haviam passado pelo Estreito de Ormuz, na divisa entre o Mar de Omán e o Golfo de Áden, por onde circulam 40% do tráfego mundial de petróleo.
 
Fonte: Blog do Omar